Informativo GEA
Biofungicidas na cultura da soja


1. INTRODUÇÃO
1.1 RELEVÂNCIA DA SOJA
A soja é a principal cultura plantada no Brasil, sendo responsável por cobrir 47,4 milhões de hectares (USDA, 2025) do território nacional. O Brasil detém o posto de maior produtor e maior exportador do grão, com uma produção que representa 39,5% da produção mundial (USDA, 2025). A produção obtida nessa área resulta em uma representatividade de 5,9% do PIB brasileiro (CEPEA, 2023), sendo muito relevante tanto pela sua comercialização direta, como por toda a cadeia de produção.
Sabendo da relevância dessa cultura para nossa economia e, principalmente para a agricultura, se torna de suma importância entender como mitigar os principais problemas que podem se tornar presentes ao longo de nosso cultivo.
1.2 DOENÇAS FÚNGICAS EM SOJA
As doenças presentes no cultivo da soja podem causar danos irreversíveis para a produção final da área, com danos potenciais de até 100% em casos descontrolados (SEIXAS et al., 2020).
Essas doenças são responsáveis por causar danos tanto indiretos, quando se há uma redução da área foliar da planta e consequentemente menor produção de fotoassimilados para o enchimento de grãos, como também os danos no grão, que pode ser afetado pelas doenças e acabar por impossibilitar a comercialização do grão em casos de dano acentuado (HENNING, A. A, 2014).
O controle das doenças na soja é realizado principalmente por meio da aplicação de fungicidas químicos, que representam um mercado muito expressivo, sendo um dos maiores investimentos no manejo da soja (MADALOSSO, M. G, 2025). Por outro lado, um mercado que muito vem se destacando é o de biológicos, isso se dá por conta de se ter observado uma boa eficácia e boa relação custo-benefício em seu posicionamento no manejo (BUENO et al,. 2022).
1.3 MERCADO DE BIOFUNGICIDAS
O mercado de biológicos tem crescido acentuadamente em nosso país e no mundo. Segundo dados divulgados pela Kynetec (2023), referentes a safra 22/23, o mercado de biológicos teve um crescimento anual médio de 50% da safra 17/18 para a 22/23. Referente ao ano anterior, a safra 22/23 teve um incremento de 45% de investimento.
Quando nos referimos especificamente aos biofungicidas, seu mercado cresceu mais de 5 vezes quando comparado com o da safra de 17/18 (KYNETEC, 2023).
Dessa forma, nota-se que o mercado tem cada vez mais se especializado e aceitado o uso de biológicos como uma opção de manejo na cultura da soja e em muitas outras, o que torna de grande importância o entendimento dessa linha de insumos para que o posicionamento seja de correta utilização.
2. BIOFUNGICIDAS NA CULTURA DA SOJA
2.1 ESPÉCIES E MODO DE AÇÃO
Tratando-se de biocontrole de doenças fúngicas na cultura da soja, dois gêneros de microrganismos são os mais citados na literatura: Trichoderma e Bacillus, sendo o primeiro um gênero de fungos oportunistas, que se desenvolvem em condições desafiadoras, e o segundo gênero corresponde a bactérias gram-positivas, presentes nos solos, mares e rios.
Para a cultura da soja, ainda é preconizado o uso de Trichoderma, sendo registradas duas espécies: T. harzianum e T. asperellum, com destaque ao T. harzianum (Mapa, 2022).
O gênero Bacillus apresenta registro para o controle de doenças de parte aérea; são capazes de produzir diferentes compostos com ação biológica, como enzimas amilolíticas, proteolíticas e compostos antibióticos (Mello, 1998). De maneira análoga, a espécie Trichoderma harzianum também possui registro para controle, principalmente, de mofo-branco (Sclerotinia sclerotiorum), sendo sua ação sobre os escleródios, estruturas de resistência produzidas pelo fungo que se encontram no solo (Sgarbossa, nd.).
As formas de ação descritas na literatura para ambos os gêneros são determinadas em três tipos, sendo estes a competição interespecífica, antibiose e
indução de resistência (Thambugala et al., 2020). A competição por nichos ecológicos e nutrientes atua no sentido de determinar a sobrevivência da espécie mais apta ao ambiente imposto, seja por estratégias adaptativas mais eficientes, entre outros. A antibiose consiste na liberação de compostos químicos que inviabilizam ou retardam o crescimento do patógeno, como por exemplo a espécie Bacillus subtilis QST-713, que produz iturina, agrastatina/plipastatina e surfactina, compostos que são capazes de inibir a germinação de esporos patogênicos (Bettiol et al., 2012). Quanto à indução de resistência, além da síntese de fitoalexinas asscociadas à resistência vegetal, estudos apontam a ativação de mecanismos de defesa por parte da planta, associados a produção de proteínas, como quitinases, que degradam a parede celular dos fungos (composta por quitina) e glucanases (Woo et al., 2014; Monte et al., 2019; Paula et al., 2021).
Quanto aos patógenos aéreos que possuem formas de biocontrole registradas, podemos citar: Colletotrichum truncatum, Septoria glycines, Corynespora cassiicola, Cercospora kikuchii e Phakopsora pachyrhizi.
Tabela 1. Fungicidas microbiológicos à base de Bacillus spp. registrados por alvo biológico, na cultura da soja.
Fonte: Mapa, 2022.
De tal maneira, para realizar o melhor manejo de doenças na cultura da soja, faz-se necessário o conhecimento do ciclo do patógeno, de modo a associar a estrutura que será controlada à época de maior ocorrência no campo e, desta forma, definir o momento ideal de aplicação do agente biológico visando seu controle.
2.2 APLICABILIDADE
Um exemplo prático que vem sendo empregado por produtores da região Centro-oeste, com ênfase no estado do Goiás, é o produto comercial Bombardeiro, da empresa brasileira Biotrop, visando o controle de doenças de final de ciclo; o produto é a junção de B. subtilis, responsável pela competição com conídios viáveis de patógenos como Rhizoctonia solani e Sclerotinia sclerotiorum, B. velezensis, responsável pela indução a produção de metabólitos antibióticos e B. pumillus, responsável pela formação de biofilme com função antibiótica.
Segundo a empresa, o posicionamento adequado do produto durante o ciclo fenológico da cultura se dá de maneira ideal com três aplicações: primeira aplicação em V4, segunda em V8 e a última em R1.
Outra prática que vem sendo amplamente empregada é a associação entre o controle químico, via fungicidas, com os biofungicidas, sendo esta modalidade a que apresenta melhores resultados. Em um experimento realizado durante dois anos consecutivos avaliou a eficiência do controle químico isolado e quando associado ao controle biológico; a associação do manejo biológico com o químico mostrou-se mais eficiente no controle de ferrugem asiática, mancha alvo e mancha parda, quando comparada ao controle químico isolado, como mostram os gráficos a seguir:
Figura 1: Área abaixo da curva de progresso da severidade (AACPS) de doenças causadas por patógenos foliares na cultura da soja.
Fonte: Santos, 2023.
Onde controle (Controle); Fungicida sistêmico (S); Sistêmico em conjunto com multissítio (S+M); produto à base de B. subtilis (Ba); Produto à base de T. asperellum (Tr); B. subtilis seguido de manejo sistêmico (Ba-S); Produto à base de T. asperellum seguido de manejo sistêmico (Tr-S); Mistura de produto a base de T. asperellum e B. subtilis (Tr+Ba); Mistura de T. asperellum e B. subtilis, seguido de manejo sistêmico (Tr+Ba-S); Aplicação de T. asperellum seguido de B. subtilis finalizado com manejo sistêmico (Tr-Ba-S). A média das severidades com a mesma letra não apresenta diferença significativa pelo teste de Tukey (P<0.05).
Quanto ao controle de ferrugem-asiática durante o ano 1, podemos depreender do gráfico que o tratamento S+M (Produto sistêmico em conjunto com multissítio) não diferiu estatisticamente do tratamento Ba (B. subtilis), Tr (T. asperellum), Ba-S (B. subtilis seguido de manejo sistêmico), Tr-S (T. asperellum seguido de manejo sistêmico) e Tr-Ba-S (T. asperellum seguido de B. subtilis finalizado com manejo sistêmico), significando a possível substituição do manejo 100 % químico pelo associativo entre químico e biológico, sem perdas neste sentido.
Para o controle de mancha alvo, durante o ano 1, não houve diferença estatística entre os tratamentos : S+M, Tr, Tr-Ba e S; no entanto, durante o ano 2, onde houve maior incidência da doença, os tratamentos S, S+M, Ba-S, Tr-S, Tr-Ba-S não diferiram estatisticamente, elencando que o manejo biológico não ocasionaria perdas na efetividade do controle da doença.
E, por fim, quanto à ocorrência de mancha marrom no ano 1, os tratamentos S+M, Ba, Tr, Ba-S, Tr-S, Tr-Ba-S não diferiram estatisticamente; e no ano 2, todos diferiram do tratamento Tr-Ba-S (T. asperellum seguido de B. subtilis finalizado com manejo sistêmico), que mostrou-se como o mais eficiente na contenção da doença.
Desta forma, fica claro a importância do manejo biológico ou associativo com o químico para controle de doenças como a ferrugem-asiática, mancha alvo e mancha marrom.
3. INCOMPATIBILIDADE DE CALDA
Quando nos referimos à biológicos, um dos principais impasses relatados por produtores é a preocupação com a compatibilidade de calda. No caso desses produtos, o que se torna um grande problema são as incompatibilidades químicas, quando se perde a eficiência do produto de maneira “imperceptível”, reduzindo o controle da doença mas visto apenas quando a mesma já se encontra altamente incidente na plantação.
Algo que pode ser realizado é a aplicação conjunta de fungicidas químicos com biológicos, visando o aumento do espectro de controle e eficácia pela ação de diferentes mecanismos de ação sobre um mesmo organismo indesejado (SANTOS, D., 2023). Grande parte dos produtos associados são compatíveis com Bacillus, sendo uma boa opção quando se tem uma mistura de diferentes produtos (ARAUJO GUIMARÃES et al., 2020).
Outra característica que podemos elencar é a compatibilidade entre agentes biológicos, sendo algo muito estudado por conta de possíveis competições entre eles. Essa competição pode se dar entre diferentes organismos, o que leva a morte ou diminuição de uma das populações, motivo de possível redução no controle e efetividade de manejo (BEVER et al., 2012).
Dessa forma, nota-se que é essencial nos informarmos ao máximo para reduzir os possíveis problemas futuros que poderão ocorrer em nossas aplicações.
Uma ferramenta que pode nos auxiliar quanto a esse manejo é o aplicativo desenvolvido pela Koppert, denominado “Compatibilidade de Produtos”. Neste aplicativo, é possível realizar simulações de diferentes misturas de calda, a fim de conferir se esta pode ocasionar em algum problema com o biológico utilizado (KOPPERT, 2025).
A tendência é que a cada ano mais seja facilitada a união de produtos com características químicas distintas para que dessa forma o manejo do produtor seja facilitado, auxiliando também a aceitação desses novos produtos pelo mercado.
4. CONCLUSÃO
Finalmente, diante de tudo que foi discutido, concluímos o crescimento acelerado do mercado de biológicos associados a tratos culturais e fitossanidade das culturas, como a soja discutida neste documento. Além disso, experimentos mostram a eficiência dos produtos, principalmente quando associados ao manejo químico, sendo os biológicos uma ferramenta a mais que o produtor deve contar para lutar contra patógenos, visando altas produtividades e maior sustentabilidade.
Autores: Gustavo de Britto (Marú-ki) e Gabriel Guerini (Boniño).
5. REFERÊNCIAS
HENNING, A. A. et al. Manual de identificação de doenças de soja. 5. ed. Londrina: Embrapa Soja, 2014. 76 p. il. color. (Embrapa Soja. Documentos, 256). Disponível em: https://www.infoteca.cnptia.embrapa.br/infoteca/bitstream/doc/991687/1/Doc256OL.p df. Acesso em: 03 de Abril de 2025.
https://biotrop.com.br/biofungicidas-multissitios-ganham-espaco-devido-a-elevada-efi cacia-e-boa-relacao-custo-beneficio/ acesso em: 10/04/2025
https://www.alice.cnptia.embrapa.br/alice/bitstream/doc/1128404/1/p.-227-264-de-SP -17-2-020-online.pdf acesso em: 08/04/2025
https://www.canaonline.com.br/conteudo/mercado-de-bioinsumos-movimenta-us-827 -milhoes-no-pais.html acesso em: 10/04/2025
https://www.koppert.com.br/centro-de-informacoes/noticias/manejo-do-mofo-branco- deve-ser-preventivo-no-inverno-para-garantir-as-safras-de-verao/ acesso em: 11/04/2025
MEYER, Maurício Conrado. Bioinsumos na cultura da soja. Brasília - Df: Embrapa Soja, 2022.














